Nesta quarta-feira, dia 11 de abril, o Supremo Tribunal Federal deve decidir se as mulheres grávidas de fetos anencéfalos terão o direito de optar por interromper a gestação sem que para isso seja necessário obter autorização judicial.

Alguns esclarecimentos: a tal da autorização judicial, hoje obrigatória, na prática faz com que muitas vezes  a mulher não consiga interromper a gravidez, ou demore meses para conseguir – o que torna o procedimento cada vez mais delicado. Ela fica à mercê de burocracias e das convicções pessoais/religiosas das autoridades responsáveis.

Um feto anencéfalo não sobreviverá. Nunca. 75 % das vezes, morrerá ainda na barriga. Dos que nascem, a maioria absoluta morre nas primeiras 24 horas. E alguns poucos têm vida vegetativa por mais alguns dias ou, no máximo, semanas.

Pergunto: por que obrigar as mães à crueldade de ter de carregar dentro de si um feto que já sabem de antemão que não sobreviverá? Que tipo de sadismo é esse?  Na maioria dos países a interrupção da gestação em caso de anencefalia já é legal. Esta na hora de o Brasil evoluir – e mostrar que é o Estado laico que diz ser.

Transcrevo abaixo um trecho do excelente texto de Eliane Brum sobre o assunto, com o link para a matéria, na íntegra, ao final.

“Divido essa coluna em duas partes. Na primeira, faço algumas considerações gerais sobre a questão que será julgada pelo Supremo a partir do meu olhar sobre ela. Na segunda, conto a história de uma mulher particular, Severina, porque aprendi que só compreendemos a vida – na vida. Em 20 de outubro de 2004, o Supremo derrubou uma liminar que permitia interromper a gestação de anencéfalo sem autorização judicial. Um dos ministros disse, ao votar: “Mas quem são essas mulheres? A gente nem sabe se elas existem”. As mulheres severinas existem. E, como veremos, são, sim, torturadas.

A pergunta que o Supremo responderá nesta quarta-feira é a seguinte: “Uma mulher, grávida de um feto anencéfalo, pode interromper a gestação sem necessidade de autorização judicial?”. Espero que a resposta da corte seja afirmativa. Acompanho o percurso dessas mulheres há quase dez anos e me parece claro que este é um debate de direitos humanos. Impedir uma mulher de interromper a gestação de um feto incompatível com a vida, se ela assim o desejar, é condená-la à tortura. Assim como também seria tortura obrigar uma mulher a interromper essa mesma gestação se ela desejar levá-la até o fim porque, por crença religiosa ou qualquer outro motivo, encontra sentido nesse sofrimento.”

http://revistaepoca.globo.com/Sociedade/eliane-brum/noticia/2012/04/chega-de-torturar-mulheres.html

E, para mais informações e dados científicos, sugiro este texto:

http://cienciahoje.uol.com.br/especiais/reuniao-anual-da-sbpc-2011/2018todos-morrem2019

A construção do herói

Publicado: março 28, 2012 em Uncategorized

 

Descalça, ela descia desabalada a rua escura e vazia.

– Corre, menina, avisa a sua mãe que o Mauro está aqui!

Ele ficaria apenas até a entrada da madrugada, o amigo parado em frente à casa pronto para levá-lo embora – por que tão rápido?

Em meio às estranhas e murmuradas conversas dos adultos naquela noite, alguma hora ela ouviu pela primeira vez a palavra “comunista”.

 

#

 

– É verdade que o tio está na cadeia?

– É.

– Mas o que ele fez?

– Nada, filha. E não fale disso com ninguém. Ninguém. Um dia, quando você for maior…

 

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A revista “subversiva” encontrada esquecida em um canto da casa. Nas páginas rosadas, relatos de tortura e violência sexual contra prisioneiras. Palavras desconhecidas, consciência de estar fazendo algo que não devia.

 

E o medo –  que ficou, e ficou.

 

#

 

Exílio.

A notícia da morte.

 

E a mãe que chorava baixinho ouvindo Victor Jara.

 

#

 

A história sendo contada aos poucos.

Os ideais, o Partido, a luta.

A clandestinidade.

O colega que havia sido preso e delatado um a um.

A prisão.

A tortura, em todos os seus requintes.

A doença.

O exílio.

A saudade infinita.

A morte.

 

E uma fotografia em preto e branco de um túmulo de granito escuro, em uma cidade muito longe.

 

#

 

Anos depois, conhecer o antigo “camarada”.

– Claro que me lembro do seu tio. Éramos amigos.

E respirar muito fundo antes de tomar coragem para perguntar, garganta apertada:

– … ele falou?

Olho no olho, ansiedade.

– Não, mocinha, ele nunca falou. Por isso foi tão torturado. Mas nunca entregou ninguém. Seu tio era um forte.

A última peça que faltava afinal se encaixando. O descanso do herói em minha memória, inteiro e vitorioso. E o choro trancafiado durante tantos anos finalmente vindo à tona.

 

Orgulho.

 

Em homenagem à minha vó, que nunca pode velar seu filho

–  e sequer levar flores ao seu túmulo.

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—–

 

Este texto faz parte da 5ª Blogagem Coletiva #desarquivandoBR

http://desarquivandobr.wordpress.com/2012/03/18/convocacao-da-5a-blogagem-coletiva-desarquivandobr-3/

Como desativar uma bomba

Publicado: março 1, 2012 em Uncategorized

Quando o assunto é segurança pública nossos políticos se envaidecem e enchem a boca para falar sobre inúmeros projetos de lei voltados à segurança utilizando medidas repressivas. Foi assim com a bomba midiática solta na década de 90 com o assassinato da atriz Daniella Perez, filha da novelista Glória Perez, quando a rede globo tomou a frente e “exigiu” a inclusão do homicídio qualificado na Lei de Crimes Hediondos. Outrora, pregou-se aos quatro cantos o apoio à chamada “lei seca”. Sem contar o discurso de pancada solto pelas ruas, que prega a pena de morte, a redução da menoridade penal, tortura como pena etc.

O problema, a meu ver, é que o aumento do número de leis repressivas tem somente um papel simbólico na sociedade. A lei penal não resolve os problemas sociais por si, e só deve ser utilizada quando os demais institutos sociais falharem (ultima ratio).

Utilizá-la como salvadora é uma falha.

A sociedade quer uma resposta rápida das autoridades políticas que, por sua vez, visando acalmar os ânimos populares, e a troco de votos, prometem uma segurança a  qualquer preço, colocando policiais nas ruas e distribuindo truculências inconsequentes.

Esse é o jeito reacionário de ser. Prega-se um Estado cada vez mais Mínimo no tocante a direitos básicos e sociais como saúde, lazer, segurança, educação (direitos sociais garantidos constitucionalmente), e, em contrapartida, impõe-se um Direito Penal Máximo, para assim conseguir exercer um controle social junto ao povo: controlar a manada.

Os EUA estão entre os países que mais adotam essa medida. A chamada Tolerância Zero tem servido para superlotar os presídios. As pessoas aplaudem, pois acham que isso lhes oferece a tão sonhada sociedade segura e livre. Ledo engano. Hoje, qualquer “cidadão de bem” nos EUA pode ser preso por desvios de conduta, por mais ínfimos que sejam. Ser pego fumando um baseado, por exemplo, por três vezes[1], pode render uma prisão perpétua. Este exemplo demonstra o preço que a sociedade tem pago às custas de se viver em um país “livre”.

 Como tudo que funciona de maneira célere e inconsequente, o efeito simbólico sobre medidas assim pulsa aos quatro cantos. Tais medidas não servem para nada, a não ser para inflar o sistema prisional. Socialmente falando, elas aumentam o pânico da população, e assim consegue-se controlar melhor o cidadão.

Outros exemplos da nossa privação de liberdade em prol da segurança de todos são as câmeras de vigilância soltas por aí, a tornozeleira eletrônica, carros com GPS´s embutidos, internet controlada. O que ninguém percebe é que você sai de casa condenado. Presumem nossa culpa ao nos filmar andando pelas ruas e lojas, prédios e praças.

Graças a medidas assim, temos um direito que ganha força e que funciona com base no rótulo que os criminologistas chamam de Labelling Approach (um direito do autor, não do fato – não muito diferente do ideal nazista), ou seja, pune-se a pessoa pelo rótulo social que lhe atribuem e não por um ato que de fato praticou. É um direito perigoso e que pode contribuir com injustiças e prisões desnecessárias, ou, indo além, levar a um regime ditatorial.

Viver repressivamente funciona? A resposta é: não. Estatisticamente, temos que apenas com investimento em educação, em áreas sociais, em dignidade humana é que conseguiremos reduzir de fato a criminalidade.

Vejamos, em números, como a repressão desenfreada não adianta. Alberto Silva Franco, grande criminalista, em seu livro Crimes Hediondos (p. 649), analisa o período em que as leis repressivas aumentaram, juntamente com o discurso da imprensa sensacionalista e policial. O jurista diz que, na grande São Paulo, analisando o período de1990 a 2003, no que toca as Ocorrências Policiais segundo a natureza do crime, percebe-se que as mesmas cresceram significativamente. Por exemplo: a prática de homicídio doloso cresceu de 8.368 para 12.323. As ocorrências de extorsão mediante sequestro subiram de 80 para 199. E por tráfico de entorpecentes, passaram de 1.307 para 3.924 ocorrências.

Nota-se, com esses dados, que a crescente repressão acentuou a criminalidade.

Analisando criticamente esses fatores, Alberto Silva Franco (p. 658, mesma obra) conclui que há uma total impropriedade de uma adoção exclusiva de uma política penal, de caráter nitidamente repressivo, para efeito da diminuição dos problemas da violência e da criminalidade.

 Mais que isso, no Brasil cerca de 85% dos presos (os números divergem em cada instituto de pesquisa) voltam a delinquir quando saem da cadeia, o que deixa claro que grande parte do crime que temos nas ruas origina-se da própria cadeia.

É importante esclarecer que, visando cumprir a finalidade da pena no Brasil, não podemos aplicá-la a um condenado com o intuito único de castigá-lo. Aqui, o que vigora é a finalidade mista, englobando a prevenção, a retribuição e a ressocialização da pessoa –  ou seja, temos várias funções para a pena. E é por isso que não teremos um preso perpétuo no nosso sistema. A nossa Lei de Execuções Penais permite a progressão do regime para que o condenado volte a viver em sociedade e se restabeleça no convívio dos seus. Logo, temos que cuidar dos nossos detentos para que a nossa sociedade seja protegida no futuro, quando da saída deles.

Dados recentes divulgados pelo Ministério da Justiça[2], traçam o perfil atual do preso. A população carcerária atual é de 513.802 pessoas.  E o pior, apenas 94.816 presos estão em programas de laborterapia-trabalho interno e externo; os demais estão ociosos na prisão.

O perfil dos internos penitenciários brasileiros mostra que eles são, em sua maioria, jovens entre 18 e 34 anos  (334.067) e homens (434.931). Quanto à formação educacional, 212.216 não concluíram o ensino fundamental e somente 34.815 concluíram o ensino médio (destes, 1.945  possuem o ensino superior completo).

Dentre os condenados do sexo masculino, 42,24% são presos primários com apenas uma condenação, 24% são primários com mais de uma condenação e 33,74% são reincidentes. Quanto aos presos do sexo feminino, que correspondem a 5,72% do total de condenados no país, 58,85% são primários com apenas uma condenação, 21,32% são primários com mais de uma condenação e 19,82% são reincidentes[3].

Com esses dados podemos traçar o perfil do nosso preso. Percebe-se que são pessoas que tiveram pouco acesso a educação e oportunidades de crescimento pessoal e que a maioria já cometeu crimes outras vezes. Logo estarão de volta à sociedade, e cuidar deles é nosso papel. Discutir medidas e maneiras de humanizar o sistema prisional é latente a uma sociedade mais justa. Ninguém aqui está pregando a impunidade, mas sim alertando que o sistema atual é um sistema burro, e às avessas.

O belo discurso repressivo se mostrou ineficiente. Mas não criemos pânico; há uma ala que acredita na implantação de métodos, com a aplicação efetiva da Lei de Execuções Penais. Há solução! E quando falamos em solução, é evidente que temos que agir diretamente na raiz do problema. Em vez de pregarmos uma rapidez desenfreada, com o aumento de leis penais, devemos nos ater a medidas mais lentas, porém mais eficazes. Investir na educação é algo que demanda tempo, mas é um investimento vital a médio e longo prazo.

O preso custa um alto valor ao Estado e há meios menos danosos à economia e à dignidade do condenado que devem ser prioritários. Por exemplo, conscientização sobre o trânsito desde a escola ou aulas de músicas e filosofia, que visam aumentar o senso crítico da criança. É assim que funciona nos países desenvolvidos e que possuem criminalidade baixa – em especial os países orientais. Uma série de medidas nesse sentido evitariam e diminuiriam a criminalidade.

 Mas e quanto aos já condenados, o que fazer? Não é segredo no Brasil que a prisão é para o pobre, negro, desempregado. Bem como não é segredo que nossas prisões giram em torno das drogas. Todas as propostas que caminham no sentido de investir no ser humano, para que esse se socialize como um cidadão quando do cumprimento da pena, fazem parte da solução.

Posso citar um método que conheço e que funciona desde meados da década de 1980, chamado APAC (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados). O método APAC é um método rígido (mais do que a rigidez de força da cadeia), de baixo custo para o governo e com índices de até 90% de ressocialização (fonte: Fbac.org.br).

Falar da APAC demandaria muito tempo e seria oportuno um artigo exclusivo. Posso adiantar que é um sistema que preza pela dignidade humana do preso, com um trabalho exclusivo de acordo com o crime que o mesmo cometeu. Ele se sustenta, trabalha, reflete e vê a “cadeia” como uma oportunidade de ser alguém. Há um trabalho conjunto com a família e com a própria vítima, de modo que todos se preparem para a volta do condenado ao seio da sociedade. Conclusão: há um número ínfimo de fugas, mesmo sem armas e policiais. A reincidência é praticamente zero, ou seja, o condenado sai e consegue trabalho, pois a própria sociedade sabe que ele estava se preparando e adquirindo experiência quando da internação na APAC.

Esses são só alguns exemplos que posso citar da benfeitoria que métodos como esse trazem à nossa sociedade. Acredito em mudança, e que ela só será possível quando descongelarmos nossa cabeça e pararmos de aceitar a comida pronta. O sistema prisional brasileiro é um problema de todos. Melhor se envolver nessa discussão que optar por silenciar e se trancafiar na sua casa “segura”, sendo um preso-livre, falando sobre a impunidade no Brasil, mas sem fazer nada para ajudar a reverter esse quadro.

[1] Three strikes, you’re out – presente em 24 estados norte americanos: Wikipedia – http://en.wikipedia.org/wiki/Three_strikes_law

[3] http://noticias.uol.com.br/cotidiano/2009/09/20/ult5772u5338.jhtm

Tadeu Francisco Rodrigues é advogado criminalista, especializado em Ciências Penais, membro da Comissão de Assuntos Prisionais da OAB/MG, Poços de Caldas, associado fundador da APAC Poços de Caldas/MG (em fase de implantação) e autor do blog de crônicas e poesias “Fragmentos de uma Vírgula” – www.fragmentosdeumavirgula.com.br

Reproduzo abaixo, na íntegra, o post de Raphael Tsavkko Garcia em seu Blog do Tsavkko.

Nele há relatos como o de um homem baleado (pelas costas) pela polícia quando saía de Pinheirinho com sua mulher, e que, já caído, ainda tomou mais um tiro.  De um psicanalista que está atendendo as crianças de Pinheirinho e fala dos efeitos que essa violência toda pode ter sobre elas. Do advogado das famílias. De Suplicy, Marrom e outros.

Foram tomados depoimentos de 507 pessoas nos abrigos. E ainda falta falar com muitos.

A cortina está sendo retirada, os podres vindo à tona, cada vez mais. Continuamos de olho, e cobrando punição para todos esses crimes.

“Segue a Ata resumida dos trabalhos da audiência pública do CONDEPE sobre as violações de direitos humanos no #Pinheirinho. A ata me foi enviada por e-mail pela leitora Camila Cunha, que vem fazendo excelentes ponderações nos comentários dos posts sobre Pinheirino no Global Voices.
Renato Simões
3 de Fevereiro de 2012 17:52

A pedido do Senador Eduardo Matarazzo Suplicy, acelerei a divulgação da ata resumida da audiência pública do Condepe-sp Direitos Humanos em São José dos Campos, a tempo de seu pronunciamento de hoje no Senado.

Íntegra da ata segue abaixo: ATA RESUMIDA DOS TRABALHOS DA AUDIÊNCIA PÚBLICA DO CONDEPE VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS DAS FAMÍLIAS DA OCUPAÇÃO DO PINHEIRINHO SÃO JOSÉ DOS CAMPOS, 30 DE JANEIRO DE 2012

Às 20 horas do dia 30 de janeiro de 2012, com o Plenário da Câmara Municipal de São José dos Campos tomado por militantes de movimentos sociais e de direitos humanos, bem como moradores da ocupação do Pinheirinho, desalojados de suas casas, teve início a audiência pública do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana de São Paulo (CONDEPE) convocada especificamente com o tema das violações de direitos humanos perpetradas contra a população daquela região antes, durante e depois da reintegração de posse da área ocupada, promovida com força policial militar, no dia 22 de janeiro de 2012.

A audiência pública foi aberta pelo Presidente do CONDEPE, Ivan Seixas, que apresentou seus objetivos e os do mutirão realizado ao longo de todo o dia por mais de 90 voluntários de entidades de direitos humanos dos Estados de São Paulo e do Rio de Janeiro junto às famílias ocupantes do Pinheirinho que estão confinadas em quatro abrigos mantidos pela Prefeitura Municipal de São José dos Campos após a reintegração de posse. O Presidente passou a condução dos trabalhos ao Conselheiro Renato Simões, designado relator do processo aberto pelo CONDEPE para apuração das denúncias de violação dos direitos humanos das famílias ocupantes do Pinheirinho.

A Mesa foi composta com a presença dos Conselheiros do CONDEPE Vicente Roig, Cheila Olala e Rildo Marques e de seu Secretário Executivo, Aristeu Bertelli. Compuseram ainda a Mesa: o representante do Ministério Público Estadual de São Paulo, promotor de justiça Eduardo Dias; o representante da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, defensor Jairo Salvador; o representante do Ministério Público Federal, procurador da República Ângelo Augusto Costa; o representante da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República, Bruno Teixeira; o Secretário Nacional de Articulação Social da Secretaria Geral da Presidência da República, Paulo Maldos; a representante do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, procuradora Ivana Farina Navarrete; a representante do Conselho Nacional dos Direitos do Idoso, Adriana Zorbi; o represente das famílias da ocupação do Pinheirinho,Valdir Martins (Marrom) e o advogado das famílias, Antonio Ferreira (Toninho). Parlamentares presentes compuseram também a mesa: Senador Eduardo Suplicy, Deputado Federal Carlinhos Almeida, Deputados Estaduais Pe. Afonso Lobato, Carlos Gianazzi, Ênio Tatto, Marco Aurélio e Simão Pedro, Vereadoras Amélia Naomi e Ângela Guadagnin, de São José dos Campos, Vereadores Itamar Alves, Laudelino Amorim e Marino Faria, de Jacareí, e Cristiano Pinto Ferreira, Jairo Santos, Tonhão Dutra e Wagner Balieiro. Coube ao relator do processo, Conselheiro Renato Simões, apresentar a ordem dos trabalhos da Audiência Pública:

1. Oitiva de depoimentos de vítimas de violação de direitos humanos durante a reintegração de posse da área do Pinheirinho;

2. Encaminhamentos do CONDEPE e órgãos presentes. Passou-se à apresentação do primeiro depoimento, de David Washington Castor Furtado, gravado pelo Conselheiro Renato Simões durante visita ao depoente, no Hospital Municipal de São José dos Campos, perante o Presidente do CONDEPE, Ivan Seixas, o deputado federal Carlinhos Almeida e o deputado estadual Adriano Diogo, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, na tarde do dia 30 de janeiro.

No áudio reproduzido pelo sistema de som da Câmara Municipal, o depoente David relata que, após a reintegração de posse da área do Pinheirinho, não conseguindo voltar à sua casa isolada pelo efetivo da Policia Militar, decidiu ir com sua esposa e amigos a um posto de cadastramento da Prefeitura Municipal. No trajeto, passando por uma área de conflito entre Guardas Municipais e populares, foi advertido de que os guardas municipais posicionavam-se para atirar contra a multidão e procurou proteger a si e sua esposa.

David relata que foi baleado nas costas por um Guarda Municipal, que atirou uma segunda vez já caído ao chão, e que foi socorrido por pessoas solidárias que o levaram até o Pronto-Socorro do Hospital Municipal. Afirma o depoente que se recorda da fisionomia do Guarda Municipal que nele atirou, e que poderia proceder ao reconhecimento fotográfico do agressor. Em seguida, foi convidada a dar seu depoimento a esposa de David, Maria Laura Silva de Souza, que com ele estava no momento em que foi baleado.

Maria Laura confirmou o depoimento de seu marido, e informou que naquele dia foi impedida por um bloqueio policial de retornar a sua casa, que todos os seus bens foram perdidos e que David tentara protegê-la quando correram do local do conflito entre os guardas municipais e populares. Lamentou o ocorrido com seu marido e a possibilidade de seqüelas motoras decorrentes do tiro, ainda a serem avaliadas pela equipe médica, e informou que em nenhum momento nenhuma assistência lhe foi oferecida por qualquer órgão público, nem ao seu marido e família. Foram ouvidas as vítimas da ação policial no Pinheirinho, cujos depoimentos, como os anteriores, constarão na integra em anexo a esta ata após a sua transcrição taquigráfica:

a. Daniele Aparecida da Silva Napoleão, moradora da ocupação do Pinheirinho, que relatou a agressão que sofreu junto com outros moradores que buscavam entrar na ocupação, isolada pela Polícia Militar desde a madrugada, visto que não passara a noite em sua casa. Relata ter levado um tiro com bala de borracha na boca, e que passou por exame de corpo de delito para comprovar a lesão dela decorrente.

b. Dulcinéia Faustino, moradora da ocupação do Pinheiro, que relatou a invasão de sua casa por policiais militares na madrugada no dia 22, no inicio da reintegração de posse do terreno ocupado, precedida do lançamento de uma bomba de efeito moral cujos estilhaços deixaram marcas ainda visíveis por todo seu corpo. Esclarece que se submeteu já a exame de corpo de delito para comprovar as lesões.

c. Paulo Maldos, Secretário Nacional de Articulação Social da Secretaria Geral da Presidência da República, que relatou estar presente ao local sem saber previamente da ação de reintegração de posse, para dar seguimento a consultas a lideranças da ocupação sobre os termos de um acordo a ser firmado entre União, Estado e Município para solucionar a questão fundiária e das moradias das famílias ocupantes. Descreveu minuciosamente a operação policial de isolamento da área, a forma desrespeitosa com que foi tratado por oficial da Polícia Militar ao se identificar como autoridade federal, a agressão por ele sofrida por disparo de bala de borracha nas suas costas enquanto conversava com moradores do Pinheirinho e a repressão policial contra as famílias da ocupação e do bairro do Campo dos Alemães, igualmente cercado pela Policia Militar.

d. Sílvio Prado, apoiador das famílias ocupantes, descreveu a violência policial nas ruas do bairro Campo dos Alemães, vizinho à ocupação do Pinheirinho, envolvendo a população das casas do referido bairro na espiral de violência que se iniciou com a repressão aos ocupantes.

e. Leandro Mascarenhas, psicanalista, relatou o trabalho que realizou durante a semana com crianças e adolescentes das famílias ocupantes nos abrigos improvisados para acolhê-las pela Prefeitura Municipal de São José dos Campos, identificando as conseqüências da violência policial, da destruição de seus lares, da agressão e humilhação de seus pais e mães e da situação precária de habitabilidade dos abrigos.

f. Valdir Martins, o Marrom, um dos lideres da ocupação, morador do Pinheirinho, relata desde as primeiras horas da madrugada a violência policial na ocupação e no bairro vizinho, a busca de prender e desmoralizar as lideranças da ocupação por parte da Polícia Militar do Estado de São Paulo, a continuidade da repressão com a invasão da Igreja Nossa Senhora do Perpétuo Socorro por policiais, a discriminação e a vida precária dos ocupantes desalojados de suas casas nos abrigos municipais.

g. Antonio Ferreira, advogado das famílias ocupantes, denunciou a violência que sofreu pessoalmente e a violência institucional contra as famílias moradoras do Pinheirinho antes e depois da reintegração de posse, lembrando a falta de políticas públicas nos abrigos e a insuficiência das alternativas apresentadas pelo Governo Municipal e pelo Governo do Estado para a garantia de direitos daquela população.

O Senador Eduardo Suplicy relatou em detalhes sua participação na mediação de um acordo envolvendo os Poderes Judiciário e Executivo (Município, Estado e União) que evitasse a reintegração de posse. Esclareceu que em seus contatos com os juízes Beethoven Ferreira e Márcia Loureiro, com o prefeito Eduardo Cury e com o Governador Geraldo Alckmin, na sexta-feira anterior à desocupação, um acordo de suspensão da reintegração de posse por um período de 15 dias para viabilização do acordo foi efetivado, e comunicado pessoalmente por ele à Assembléia das Famílias ocupantes do Pinheirinho no sábado, véspera da reintegração de posse. Informou que agiu de boa fé, e que pretende cobrar a palavra dos demais e a apuração do comportamento dos juízes e autoridades do Executivo na inviabilização do acordo que preveniria, com políticas públicas, a violência da ação militar do dia 22.

A Procuradora Ivana Farina relatou a atuação do CDDPH na questão do Pinheirinho desde 2006 e a reunião realizada no período da tarde do dia 30 com a Prefeitura Municipal de São José dos Campos sobre as políticas públicas de amparo às famílias desalojadas, da qual participaram os Conselhos de Direitos Humanos nas esferas federal (CDDPH) e estadual (CONDEPE) e os Conselhos Nacionais dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA) e da Pessoa Idosa. O representante da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República relatou a atuação da Ouvidoria nos dias que precederam à reintegração de posse e a agressão que sofreu, com dezenas de famílias, na invasão policial da Igreja Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. O relator do processo do CONDEPE sobre o Pinheirinho, Renato Simões, apresentou os principais dados do trabalho realizado pelos voluntários de entidades de direitos humanos que formalizaram o depoimento de vítimas de violação na ação de reintegração de posse do Pinheirinho, ao longo de todo o dia 30.

Foram tomados a termo os depoimentos de 507 pessoas, nos quatro abrigos municipais (CAIC Dom Pedro, Ginásio Ubiratan – Latão, Ginásio Morumbi e Vale do Sol), que assinaram os formulários oferecidos pelo CONDEPE com seus depoimentos. Destas, 23 pessoas afirmaram ter sofrido violência física que deixaram, passada mais de uma semana das agressões, marcas em seus corpos, e assinaram o pedido de realização de exame de corpo de delito para registro das lesões por balas de borracha, estilhaços de bombas de efeito moral e golpes por objetos contundentes (tonfas, cassetetes…).

O relator Renato Simões registrou que o universo de violações é muito mais amplo que esse registro já massivo, visto que muitas pessoas não se encontravam nos abrigos no horário comercial em que os depoimentos foram colhidos, por estarem trabalhando. Além disso, o trabalho dos voluntários se circunscreveu aos abrigos, deixando de atingir dois públicos igualmente importantes quantitativa e qualitativamente para a apuração das violações: o composto pelas famílias ocupantes do Pinheirinho que não aceitaram, por várias razões, viver nos abrigos da Prefeitura Municipal, e o composto pelas famílias moradoras do Campo dos Alemães, bairro vizinho à ocupação, onde a ação policial militar e da Guarda Municipal se espalhou indistintamente a violência contra os cidadãos.

O relator apresentou ainda os dados relacionados à situação de crianças, adolescentes e idosos colhido pelos Conselhos Nacionais junto às famílias abrigadas, que foram objetos de debate com os Secretários Municipais de Desenvolvimento Social, João Francisco Sawaya de Lima, e de Assuntos Jurídicos, Aldo Zonzini Filho. Registrou-se a existência de 1069 crianças e adolescentes nos quatro abrigos, em flagrante desrespeito às exigências do Estatuto da Criança e do Adolescente, e 50 idosos, igualmente lesados nos seus direitos previstos no Estatuto do Idoso, entre outras legislações em vigor.

A insegurança das famílias quanto à garantia de rematrícula das crianças e adolescentes na rede escolar de São José dos Campos, a perda do material escolar com a destruição das casas no processo de reintegração de posse, a falta de informações sobre as alternativas de transporte escolar e acesso dentro do calendário do ano escolar e as conseqüências psicológicas sobre as crianças e adolescentes das situações de violência vividas foram as principais queixar registradas com a cobrança de definição de prontas respostas da Prefeitura Municipal para as políticas públicas voltadas à criança e adolescente.

O relator Renato Simões apresentou os objetivos do processo do CONDEPE.Em reunião com a Delegacia Seccional de Polícia, realizada na tarde do dia 30, com a presença dos Conselheiros Ivan Seixas e Renato Simões, dos deputados Adriano Diogo e Carlinhos Almeida, do vereador Tonhão Dutra e do advogado Aristeu Neto, representante jurídico das famílias, foi solicitada a abertura de inquérito por parte da Delegacia Seccional para apuração das denúncias de abusos cometidos na ação de reintegração de posse, a avocação dos inquéritos já abertos no 3º Distrito Policial referentes às vítimas Guilherme Boulos e David Washington Castor Furtado para a Delegacia Seccional e a imediata realização de exame de corpo de delito nas 23 pessoas que o solicitaram junto aos voluntários do CONDEPE. Ofício neste sentido foi assinado pelos Conselheiros do CONDEPE durante a própria audiência pública e protocolado formalmente no dia seguinte.

A tabulação dos dados dos formulários sobre violação dos direitos humanos preenchidos pelas pessoas ocupantes do Pinheirinho será feito sob responsabilidade do CONDEPE em parceria com o Núcleo de Trabalhos Comunitários da Pontificia Universidade Católica de São Paulo. O relator Renato Simões recebeu e fará constar da ata dos trabalhos o documento “Pinheirinho: Um Relato Preliminar da Violência Institucional”, elaborado por Brigadas Populares/MG, Justiça Global, Rede de Comunidades e Movimentos Contra a Violência. O CONDEPE e a Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo estudam o teor de uma representação ao Conselho Nacional de Justiça sobre a atuação do Poder Judiciário na invalidação dos esforços de uma saída negociada para a ocupação e na eclosão da operação policial de reintegração de posse.

O relatório do CONDEPE, ao ser finalizado, será encaminhado aos órgãos nacionais e internacionais de Direitos Humanos para as providências cabíveis, ações judiciais de reparação de danos e de responsabilização civil e criminal dos autores das violações. Nova audiência será determinada, após o relatório preliminar das denúncias, para oitiva das autoridades envolvidas no conflito.

Foram ainda anunciadas, pelo relator, as atividades desta semana. Na quarta-feira, dia 1º, no Auditório Franco Montoro da Assembléia Legislativa de São Paulo, nova audiência pública sobre violência no Pinheirinho, convocada por deputados estaduais. Na quinta-feira,dia 2, na Praça Afonso Pena, em São José dos Campos, ato nacional de solidariedade às famílias do Pinheirinho. Sábado, dia 4, também em São José dos Campos, mutirão de assistência judiciária às famílias do Pinheirinho, de responsabilidade da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, para o qual já se dispõem a participar cerca de 20 dos voluntários presentes, que participaram do mutirão do dia 30 de janeiro do CONDEPE.

Devolvida a palavra ao Presidente do CONDEPE, Ivan Seixas deu por encerrados os trabalhos. São José dos Campos, 30 de janeiro de 2012 Renato Simões – Conselheiro-Relator Ivan Seixas – Conselheiro-Presidente CONDEPE/SP ”

 

Fontehttp://www.tsavkko.com.br/2012/02/pinheirinho-ata-dos-trabalhos-do.html

Não bastasse toda a violência policial contra os moradores de Pinheirinho durante a desocupação, as bombas, as balas de borracha, os ataques injustificados, as agressões a crianças… agora começam a aparecer denúncias de violência sexual por parte dos policiais.

O documento abaixo, do Ministério Público, traz as denúncias feitas por seis pessoas, entre elas um senhor de 87 anos. Violências físicas, psicológicas, sexuais.

Até quando a imprensa vai calar? Até quando os responsáveis por todos esses absurdos vão ficar sem punição?

(Fonte: http://www.ptnosenado.org.br/textos/122-curtas/12012-suplicy-acompanhou-denuncias-de-violencia-sexual-cometida-pela-pm-no-pinheirinho)

“De acordo com o último levantamento realizado pelo InfoPen (Sistema Integrado de Informações Penitenciárias), em junho de 2011, o Brasil continha 513.802 presos em todo seu sistema prisional, num total de 1.237 estabelecimentos penais (entre penitenciárias, cadeias públicas, casas de albergado, colônias agrícolas e hospitais de custódia).

Com esse montante de detentos e considerada a população nacional utilizada pelo DEPEN (Departamento Penitenciário Nacional), de 190.732.694 habitantes, o Brasil apresentou uma taxa de 269,38 presos a cada 100 mil habitantes. Taxa que em 1990 era quatro vezes menor, um total de 61,4 presos a cada 100 mil habitantes, considerados os 90.000 presos registrados pelo DEPEN e a população de 146.592.579 de habitantes, de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Mas o problema não se encerra na quantidade de detentos. Além de contar com um crescimento vertiginoso e desenfreado de presos, o que por si só já demonstra a situação calamitosa do Brasil, o país não tem condições de abriga-los nos estabelecimentos prisionais existentes, que se mostram em situação precária e abandonada, deixando os detentos em condições de vida primitivas e desumanas.

Exemplo disso é o que ocorre numa delegacia de Anápolis (GO), na qual não há espaço para os detentos serem alojados, razão pela qual o delegado os mantêm nos corredores do local algemados uns nos outros ou em argolas de ferro embutidas nas paredes, conforme notícia veiculada pelo jornal Folha de São Paulo.

Assim, em razão da precariedade e desestrutura carcerária, a resposta para a criminalidade tem sido o atentado contra a dignidade e os direitos dos presos, que encontram nos estabelecimentos penais não um campo de reeducação ou ressocialização, mas de concentração e extermínio.”

Luiz Flávio Gomes – LFG – Jurista e cientista criminal. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto de Pesquisa e Cultura Luiz Flávio Gomes. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001).

Mariana Cury Bunduky – Advogada e Pesquisadora do Instituto de Pesquisa e Cultura Luiz Flávio Gomes.

Fonte: http://www.ipclfg.com.br

 

COMENTÁRIO:

Estar preso não significa deixar de ser cidadão. A punição pelo crime cometido é a privação da liberdade de ir e vir, pelo tempo definido pela Justiça. Qualquer coisa além disso é violação de direitos humanos, e pura crueldade do sistema carcerário contra eles – o que não deixa de ser um crime também. E não se preocupar em gerar mecanismos para que ao saírem da cadeia essas pessoas possam se ressocializar… é burrice.

Desviantes.org

Publicado: fevereiro 2, 2012 em Uncategorized

desviante
(desviar + -ante)

adj. 2 g.
1. Que se desvia.
2. Que diverge ou se diferencia.
Ou ainda:
– Que não segue a maioria;
– Que se afasta daquilo que é considerado aceitável;
Essa é a ideia central deste blog. Ser um espaço para pensamentos desviantes, para ideias, opiniões, fatos que a grande imprensa não costuma divulgar. Para contestações, dúvidas, inquietações, denúncias. Um espaço de resistência, aberto a participações, com vozes desviantes de várias áreas.
Sejam bem-vindos.